quinta-feira, 6 de agosto de 2009

Copos de alumínio

Fazia tempo que eu não tomava água num daqueles copos de alumínio...

Quando sede pede um copo d'água bem gelado, a garganta pulsa numa peristalse seca... na hora que bate na superficie metálica do copinho; o esbranquicado crescente... no primeiro gole, quando toca o copo, já sente a frieza do material e o liquido refrescante em perfeita combinação...

saciedade e nostalgia...

Essa sensação é exatamente a mesma de quando, na casa do meu avô querido, eu tomava agua num desses copos. Ele guardava, estrategicamente, dentro do freezer... brilhante!!

É dificil explicar uma coisa que foi sensação ... uma forma do teu corpo responder à um estímulo. Mas a verdade é que o sentimento de satisfação vem sempre acompanhado da nítida lembrança dele... dos momentos mais simples da nossa convivencia. Da sintonia dos olhares surrealmente sorridentes...

Era o copo dele, no lugar dele (congelando), como tudo dele era no lugar dele. Qualquer desvio, qualquer falha, seria notado. A lucidez mais insana que já pude vivenciar... sabia de tudo, qualquer assunto. Era de uma dureza incrivel e uma sensibilidade admirável...

Métodos eram muitos... ler a bíblia todos os dias, andando pelo corredor e cruzando com a unha o salmos que já haviam sido lidos. Banhos demorados. Leite de rosas. Leituras cotidianas e programadas.
A telvisão era toda previamente planejada, horarios definidos. O lanche era no horario do jornal, o volume era no mais alto e a atencao redobrada no que era dito. Passava a mesma quantidade de requeijão (colocado na borda do prato) nos mesmos sanduiches grelhado com queijo por cima... colocando a mesma quantidade de nescáfe, com a mesma colher, na mesma quantidade de leite.

Na hora de dormir o meu colchão era colocado do lado da cama deles. Pra eu nao passar nenhum minuto longe... eu adorava o cheiro da madeira no quarto, a luz fraca vinda do lado dele e o lencol fininho que me bastava aquecida... Me lembro de muitas vezes lutar contra o sono pra ficar observando, por baixo da cama, o amarelo-opaco que provinha só daquela direita do quarto... e ouvia minha vó ressonar, com o braço por cima dos olhos...

Até hoje me pergunto o que ele viu em mim... de onde vinha tanto amor se tudo que ele conheceu foi a minha parte quando eu nao sabia valoriza-lo devidamente... que hoje, tantas coisa eu queria mostrar e dividir e perguntar. Me descontrola o peito pensar que perdi tempo... que muitas vezes ele quis me mostrar, me ensinar... mas a ingenuidade me fechava qualquer entrada para o tudo que ele podia me passar...

Eu podia ter aprendido muito mais... por tudo que ele foi pra mim!

Ele foi meus passos de dança, bochechas coladas e meus sonhos no colo. Foi os assobios afinados e o bom gosto musical. Foi os filmes antigos bem explicados. Os gritos furiosos com o futebol...

Sei que ele podia me fazer melhor, se eu pudesse mostrar o que eu sou...

Eu só queria que tivesse sobrado mais tempo pra aprender a ser mais como voce, vô.

Mas pelo menos uma coisa eu aprendi... o meu copo de alumínio vai ficar no congelador!

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